Fonte da juventude

Corpos que não envelhecem fazem parte do sonho das ciências e tecnologia. Há uma linha muito tênue que separa o cuidado saudável do corpo, de uma posição compulsiva com a estética. O sujeito não é apenas o que o seu corpo é. Têm também a sua história e o corpo é parte dela. Esta fronteira depende, portanto, do significado que o sujeito dá para o seu corpo e da sua apropriação ou não.

A esperança da imortalidade diante dos avanços tecnológicos, como a possibilidade da clonagem humana, parece sair do campo simbólico. O efeito imaginário da clonagem expõe um ideal da contemporaneidade: seres com corpos absolutamente perfeitos e a caminho da imortalidade, e isto significa o resgate do mito de Narciso.

Com o advento tecnológico, a ciência faz com que o sujeito tenha a ilusão de que pode ficar se esquivando da morte ou pode ser eternamente jovem. A morte precisa ser aceita. Ela é inevitável e só ela dá sentido à vida. Conclui-se que corpos sem morte equivalem a corpos sem vida. Isto faz pensar que corpos perfeitos são sem vida e, por conseguinte, vazios e todos iguais (CARNEIRO, 2005).
Não temos uma imagem de nós mesmos como velhos, pois este processo é lento e silencioso, traço a traço, ruga a ruga. Percebemos, entretanto, com facilidade o envelhecimento do Outro. Mucida (2004) lembra que a palavra velho (vieux), em francês, guarda tanto a palavra vie (vida) como o pronome pessoal eux (eles). Velho é sempre o Outro, no qual não nos reconhecemos.

A fonte da juventude sempre foi uma busca humana, justo por não aceitar e reconhecer a morte. A vida eterna é um produto enlatado, industrializado e lucrativo em nome da perpetuação de um sonho narcisista e mortífero. A aparência oferece ao sujeito a identidade de que ele imagina ser detentor. O sentido da vida no mundo midiático reduz-se à produção do corpo (KEHL, 2004).

Kehl (2003) afirma que o mundo é um eterno espelho dos humanos, da sua mesquinhez e ridículas pretensões. O ser e o parecer se confundem. Questiona-se se é possível ser algo além do que se aparenta, ou se é possível aparentar justo o que não se é. A aparência é um operador da percepção do que o sujeito supõe ser (CARNEIRO, 2005).

REFERÊNCIAS

PIMENTEL, Déborah. Beleza Pura. Estudos de Psicanálise. Salvador, n. 31, out 2008, p. 43 – 49.
KEHL, Maria Rita. À sua imagem e semelhança. Revista Época, 6 jan. 2003, p.22.
KEHL, Maria Rita. Vis ibilidade e espetáculo. In: KEHL, M.R.; BUCCI, E. Videologias. SãoPaulo: Boitempo, 2004, p.141-161.
MUCIDA, Ângela. O sujeito não envelhece: psicanálise e velhice. Stylus Revista de Psicanálise, Rio de Janeiro, Associação dos Fóruns do Campo Lacaniano, n.8, abr. 2004, p.39-52.
CARNEIRO, Cristina. Produz-se um corpo imagem: perfeição que vocifera contra nós? Revista Tempo Psicanalítico, Rio de Janeiro: Sociedade de Psicanálise Iracy Doyle – SPID. 2005, v.37, p.153-165.

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