Supervisão clínica ou disfarce de análise?

Os limites do processo analítico são fronteiriços aos da supervisão, principalmente em referência ao desejo do analista (desejo de saber). Alguns dos efeitos da supervisão são, por vezes, próximos aos de uma análise, apesar de outros serem específicos da supervisão e só serem obtidos através da sua prática.

Quando se procura uma supervisão, o sujeito vem em busca de um saber que supõe que o supervisor o tenha e lhe transmita. A supervisão, neste contexto, é um ato analítico, pois envolve desejos inconscientes, transferência manifestada na busca de resposta no supervisor, de algo que não se sabe, e faz ato, na medida em que o supervisor não responde à demanda do jovem analista com um saber pronto e permite que ele continue sua busca em uma franca transferência de trabalho.

Muitas vezes, no entanto, a supervisão encobre uma outra demanda, a terapêutica, sem que, no entanto, o jovem psicanalista perceba. Enquanto isso, na sua análise, falar de seus pacientes nem sempre constituir-se-á uma resistência, ainda que o oposto seja verdadeiro, ou seja, as resistências podem ser mantidas falando-se de qualquer coisa, inclusive pacientes e é preciso falar disso também, sob pena destas resistências não terem a chance de serem percebidas e elaboradas.

Ser psicanalista para Conrad Stein é não ser curado e nem formado, mas capaz de prosseguir sua análise para além do tempo das sessões que se teve enquanto analisando.

O jovem psicanalista após sua análise, e graças a seus analisandos, vai perceber o quanto permanece exposto ao inconsciente na medida em que se dá conta que funciona com referências que ele desconhece e que o governam sem que ele saiba. A supervisão vem, assim, se inscrever em uma continuação que faz parte da análise do psicanalista, e ela, de fato, toma uma dimensão de busca, que é analítica portanto, até porque, lá serão também questionadas as razões da sua escolha por tornar-se psicanalista e os valores de um psicanalista. Neste momento o trabalho da análise e da supervisão se superpõem, e começa o jovem analista, a dar prioridade aos conflitos dos seus próprios analisandos e não mais aos seus, ficando difícil sustentar a prioridade da sua análise, tornando-se de fato, algumas vezes, a expressão de suas resistências à um aprofundamento de suas questões pessoais.

Muitas vezes o analisando suscita no seu jovem psicanalista, conflitos e questões transferenciais que o remetem à sua própria análise e que envolvem o seu próprio psicanalista, o seu supervisor, ou a própria psicanálise. Não há nada mais adequado, senão o fato de, paralelo à sua análise pessoal, que um jovem analista escolha um outro espaço para falar de sua transferência e das vicissitudes da sua prática clínica: a supervisão. Note-se, no entanto, que a contratransferência, apesar de ser percebida e falada na supervisão, tem um setting mais privilegiado para ser elucidada: a análise pessoal desse analista. Esta afirmação nos leva a postular que o ideal é que a análise pessoal se prolongue pelo tempo da supervisão favorecendo uma análise da contratransferência que tem a capacidade de obstruir a evolução do trabalho psicanalítico do jovem analista com seu analisando. A análise da contratransferência e dos pontos cegos do analista não são objetos de trabalho na supervisão ainda que possam ter sido detectados aí.

Em contrapartida, diante de um determinado impasse ou conflito do analista, desencadeado pelo material do analisando, é preciso que o supervisor também não deva tratar o seu supervisionando como um “caso clínico” seu, interpretando sua contratransferência. A recomendação é que este supervisor, no máximo, indique ao jovem analista o caminho de sua análise pessoal. Considerando a supervisão mais uma fonte geradora de angústias, é preciso que o supervisor deva manter isenção e neutralidade, de sorte a não interferir no curso da análise pessoal do seu supervisionando aumentando seus conflitos.

Por vezes também, o supervisionando empreende uma supervisão racionalizada, defensiva, e por isso mesmo, bem disfarçada fica a sua demanda terapêutica que se furta à uma análise, na tentativa de manter um distanciamento “seguro” do seu supervisor. Escondendo-se na correlação prático-teórica, revelando muito pouco da sua prática clínica, esta supervisão na realidade seria, sem dúvida, uma forma possível de retomar à sua análise sem, no entanto, submeter-se a ela.

É definitiva a afirmação que a análise de um psicanalista é de caráter interminável, na medida que seu processo de análise pessoal tem continuidade na análise que ele empreende com os seus analisandos.

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