Três senhorinhas brasileiras pelas estradas texanas

“Um bom viajante não tem planos fixos nem tão pouco a intenção de chegar”
LaoTzu 

“Aventura vale a pena”
Esopo

Caro leitor, andei saindo da rotina, mas não esqueci de você! Eis-me de volta! Estava em uma “road trip”. Imagine, três “old ladies” dirigindo pelas estradas americanas, desbravando os Estados de Louisiana, Mississipi, Tennessee, Arkansas e Texas. Uma aventura!

Viajei sem entrar nas redes sociais, sem programar nada, sem saber onde iríamos. Sem reservar hotel.

Segundo o amigo cinéfilo Anselmo Mariano, nós lembrávamos o filme “Easy rider” – em português, “Sem destino” -, com Peter Fonda e Dennis Hopper, que encontravam um terceiro companheiro na estrada – Jack Nicholson.

Após algumas horas dirigindo, certo dia chegamos em um lugar muito pitoresco, uma cidade linda, tipicamente texana: Fort Worth Stock Yards.

Usávamos as três camisetas iguais: no peito havia ilustração de um Jeep colorido com garotas supostamente muito alegres, desbravando emoções e a frase “Happy mind! Happy life!” – “mente feliz, vida feliz”. Era, sem dúvida, um estado de espirito.

A nossa primeira camiseta foi um presente da amiga brasileira Lívia Vilanova, verdadeira americana há 21 anos: um carro na estrada e a frase “let’s get lost” – significa “vamos nos perder” -, título de uma música de G-Eazy.

Literalmente nos perdemos algumas vezes, porém só por alguns minutos, e o GPS recalculava as rotas, provocadas por nossa suposta dislexia – confusão entre direita e esquerda – e muitas risadas. Coisas que só as mulheres entendem.

Compramos três outros modelos de camisetas ao longo da viagem: duas que versavam sobre “road trip” – viagem por estradas -, adquiridas em Memphis e a outra em New Orleans. E a melhor delas: “Better together” – melhor juntas -, usadas quando deixamos o Texas.

Fazíamos um sucesso incrível por onde passávamos, usando o nosso look jovial. É melhor adolescer do que adoecer. Queriam saber se éramos amigas ou irmãs, qual o roteiro da nossa “road trip” e elogiavam a nossa disposição e aventura. Houve até uma dupla de mãe e filha, em New Orleans, que pediu fotos conosco. Éramos uma atração.

Nas ruas de Fort Worth, crianças, jovens e idosos usavam botas de couro e chapéu de cowboy em um sol escaldante de 35 graus centígrados. Calorão causticante, tão bom e forte quanto o do sertão sergipano.

Procuramos estacionamento público ou parquímetro e não encontramos. Estávamos com medo de uma multa. Ao lado de uma arena de rodeio, carros estacionavam livremente e assim o fizemos, por desejo, risco e conta própria.

Estava acontecendo na arena uma exposição dos filmes de “John Wayne: an American experience” e a bilheteria já havia encerrado. Acho que meu pai, Nazário Pimentel, não nos perdoará por termos perdido aquela oportunidade, mas há de convir que nós já parecíamos personagens dentro daquela cidade, que era um incrível cenário de um dos muitos filmes de faroeste estrelado por John Wayne. Só destoávamos nos trajes.

Transeuntes sorridentes, pareciam que bebiam água temperada com lítio: todos felizes e bem-humorados, alguns se deslocavam de cavalos, não sei se eram nativos ou turistas fazendo onda.

Mas com certeza aqueles que circulavam nas carroças, tipo diligências, meio de transporte do Velho Oeste, estes eram turistas. Havia filas com muitas crianças e até adultos para fazer fotos, montados em touros de verdade.

Depois de passearmos exaustivamente por aquele lugar, decidimos entrar em um bar com música country, ao vivo: “Second Rodeo Brewing”. Decoração linda e despojada.As paredes pichadas e logo na entrada uma série de fotos de artistas americanos famosos, fichados em departamentos de polícia. Entre eles, lembro de ter visto Johnny Cash, Robin Williams, e até Elvis Presley.

Ainda na entrada havia uma cela de prisão com vaso sanitário e uma cama típica, onde você pode fazer sua foto, nada glamurosa, atrás das grades ou até sentado na privada, com frases sobre a sua cabeça: “Estou aqui só passando um tempo”; “O juiz pediu para eu pensar e esperar aqui”; “É dureza uma mente que sofre de constipação”.

Claro que eu me recusei a fazer a foto. Mas as meninas não resistiram e experimentaram os dois únicos lugares da cela, fazendo caretas.

O bar Second Rodeo era um imenso galpão com uma árvore plantada no meio. Eles produzem a sua própria cerveja e o visitante tem a visão dos grandes tonéis de aço e esbarra nos sacos de Malte. Além do balcão, havia no lugar de mesas tradicionais inúmeras ilhas de diferentes decorações, com sofás e poltronas de latão ou tonéis cortados, lareira e a cabeça empalhados de um touro.

O teto totalmente retrátil, estava com dezenas de chapéus, violões e violas penduradas – e as paredes pichadas, claro, com frases de puro bom humor.

E o show começou. Era um show man, vestido como um legítimo e orgulhoso texano e tocava violão e gaita simultaneamente, e cantava, claro. Não lembro de ter reconhecido uma única canção. Mas a gaita encantava e nós aplaudíamos.

A caçula das meninas não resistiu a uma cerveja clara, produzida pela casa. Eu a acompanhei. Sensacional. A motorista só bebe água. Por convicção, já é alegre por natureza e teme se perder e também por segurança: era a nossa motorista.

Chegou a hora do pipi. Deixei as duas na mesa e fui ao banheiro. A porta era como as grades de uma prisão. E… tcham tcham tcham… grata a tamanha surpresa: dentro do gigante banheiro, havia três imensos posters de homens musculosos e maravilhosos seminus. Quer dizer, quase todos… Tinha um que era gordinho e careca, mas era charmoso. Entrei em um toilette e a porta interna era um grande mosaico de homens lindos.

Voltei e disse às meninas que elas iam adorar fazer uma visita ao banheiro. Uma delas, mas espevitada, disse que tinha curiosidade de ver o banheiro dos homens. E lá se foram as duas. Uma pedindo para a outra não ousar fazer a proeza ameaçada. A primeira deixou a medrosa do lado de fora, para vigiar a porta, e que desesperada gritava para a outra sair, pois tinha um homem vindo para usar o banheiro.

O pobre coitado ficou confuso por ver duas mulheres, uma gritando e a outra rindo, e achou que estava mergulhando numa fria e na “porta de cadeia” errada. As meninas explicaram que ele estava certo, e elas é que eram curiosas. Ele declarou desejo de conhecer o das mulheres, e elas generosamente o mostraram para ele. Os três saíram rindo dos banheiros.

O detalhe das fotos que chocaram as meninas no banheiro dos homens: eram mulheres feias, velhas, enrugadas e até sem dentes. Um circo de horror em preto e branco. As meninas, pelo contrário, eram totalmente contempladas.

Fomos para o nosso hotel e no dia seguinte voltamos para downtown e estacionamos dentro da área da maior loja de botas e chapéus da região: Cavender’s. E o vendedor da loja, quase adolescente, pousou, a pedido, e meio constrangido, ao nosso lado, vestido a caráter.

O surpreendente deste dia ainda estava por vir. No para-brisa do carro no estacionamento da loja, na volta, encontramos uma multa. Atenção: era referente ao dia anterior. Eles nos rastrearam desde a véspera, e nos alcançaram.

Ou seja, a dona inteligência artificial nos acompanhou por satélite pelas ruas, esperou sairmos do hotel e nos seguiu até a loja, quase 24h depois. Multa paga através de QR Code: US$ 40.

Foi uma experiência interessante para nós e muito rica para o município. Fica o alerta: cuidado onde você estaciona os seus desejos.

originalmente do JLPolitica.com.Br

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